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‘Perdão é sair da mão do agressor’, diz Carla Madeira sobre escolha que dividiu leitores

  • Foto do escritor: Bianca Fávero
    Bianca Fávero
  • 4 de dez.
  • 3 min de leitura

Em entrevista exclusiva ao Capítulo Z, a autora de ‘Tudo é Rio’ revelou processos criativos e refletiu sobre o papel da literatura diante da violência banalizada


Carla Madeira, autora de 'Tudo É Rio', 'Véspera' e 'A Natureza da Mordida'
Cris Cortez/Divulgação

Carla Madeira não tem medo de entrar nas zonas mais sombrias da alma humana. Ela observa a dor com lucidez, desmonta brutalidades vistas frequentemente nas páginas dos jornais e, ao falar de perdão, propõe algo que exige coragem. Sua literatura nasce desse lugar, onde enfrentar o que machuca é o primeiro passo para reassumir o controle da própria história.


Desde cedo, a autora enxergou a arte como uma forma de expressão inevitável. Com caminhos que cruzaram o jornalismo e a publicidade, Carla sempre esteve cercada por linguagens que moldam histórias, e também pela música, já que tocava violão e compunha canções. Talvez por isso, segundo ela, a literatura tenha surgido com tanta naturalidade.


“Quando comecei a escrever, não sabia se ia ser um texto que ia parar na gaveta, se ia ser um poema, um conto, mas eu nunca imaginei que seria um livro. [...] Tudo foi muito ligado ao prazer ou talvez a necessidade de estar fazendo aquilo. É como eu quis passar meu tempo. Eu brinco que [para começar um novo livro] é pelo instante”, conta em entrevista exclusiva ao Capítulo Z


Entre as marcas registradas de Carla, está justamente a disposição de olhar de frente e com dualidade o que a maioria prefere manter à margem: a dor, desejo, culpa, paixão e crueldade. De seu livro de estreia, Tudo é Rio, ao mais recente Véspera, a autora mergulha na exposição de fraturas íntimas de relacionamentos amorosos e familiares como um todo. 


Para tratar de temas tão sensíveis, a escritora admite que precisa se desvencilhar da autocensura na primeira etapa da criação. Quando começa a rascunhar as primeiras páginas, ela se lembra das guerras, notícias sobre relações abusivas, entre outros crimes, que passam às vezes despercebidos na rotina turbulenta das pessoas. “Lidamos com uma banalização da violência muito forte, mas quando a gente recorta isso parece que jogamos um holofote, o que a literatura faz muito bem, porque cria oportunidades para conversar sobre isso”, ressalta Carla.


O perdão que dividiu a opinião de leitores


Em Tudo é Rio, romance de estreia de Carla Madeira, a história acompanha o encontro de três personagens marcados por violências diferentes, mas igualmente devastadoras. Dalva e Venâncio vivem um casamento atravessado por amor intenso, mas cercado por ciúmes e possessividade. Quando a dor chega cedo demais, Venâncio, consumido pela culpa, tenta sobreviver ao próprio desespero, enquanto Dalva busca reconstruir a própria existência. Nesse caminho surge Lucy, uma prostituta que simboliza desejo, mas que também carrega traços de abandono e solidão.



Tenso e profundamente humano, o enredo segue para um desfecho aberto que sugere um gesto de perdão do próprio Venâncio diante das brutalidades que cometeu. Para alguns leitores, trata-se de um ato simbólico, uma tentativa de romper ciclos de violência. Com o sucesso do livro, porém, surgiram críticas que interpretaram esse final como uma possível romantização de um relacionamento abusivo.


Carla explica que muitos leitores confundem perdão com esquecimento, como se o gesto significasse “colocar uma pedra em cima” da violência e seguir em frente como se nada tivesse acontecido. Mas, para ela, “o perdão de Venâncio não é sobre impunidade”, mas sobre autonomia e rompimento do ciclo de agressão.


“Se você é agredida, não perdoa e fica com ódio, todos os dias, de certa maneira, aquela agressão vai se repetir e quem passa a comandar a sua vida é o agressor. Ao passo que, se você perdoa, você sai da mão do agressor. Você não precisa continuar casada com ele, não precisa nada. Perdoar não significa que o sujeito não vai ser punido”, enfatizou.


Um olhar para o futuro


Durante o bate-papo no Entre Aspas, Carla adiantou que o tema do perdão voltará a ser discutido em seu próximo livro. A trama parte de uma situação extrema em que uma mãe denuncia o próprio filho. Essa escolha, segundo ela, abre espaço para discutir a repetição social da violência e os limites de uma lógica baseada apenas na punição individual. 


“A gente vive numa engrenagem que produz violência. Você pune um, mas vem outro. Põe três na cadeia, aparecem quatro. Só esse mecanismo não é suficiente para desarmar a violência”, conclui.


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